Em finais de 2004, o IEFP (Instituto de Emprego e Formação Profissional) começou a repensar os modelos de trabalho na área administrativa. Resolveu assim avançar com um modelo de reorganização interna nessa área. Este projecto de restruturação de processos internos teve várias fases.
A primeira fase envolveu o levantamento do "modus operandi". Ou seja, da forma como o trabalho era realizado no dia a dia. Os responsáveis pela área administrativa sabiam o que faziam e o que tinham a fazer, mas esse saber não estava documentado. Sentiram então a necessidade de proceder a uma organização mais formal e de sistematizar toda a metodologia de trabalho.
Face a esta necessidade, o IEFP recorreu à Sinfic, no sentido de implementar uma óptica de trabalho por processos. Segundo Sara Ribeiro, directora de serviços administrativos no IEFP, o trabalho por processos permite saber a cada momento onde se está e, consequentemente, acompanhar melhor o trabalho e o desempenho.
A segunda fase do projecto envolveu a sistematização, o mapeamento e a implementação de todos os procedimentos internos. Recorde-se que este trabalho foi sobretudo de standardização interna de processos ao nível dos serviços administrativos das várias unidades operativas do IEFP espalhadas pelo país (cerca de duas centenas).
O sucesso da standardização de processos na área administrativa do IEFP já produziu um efeito de contágio na instituição. Desta forma, a área financeira do Instituto já avançou para um projecto idêntico de mapeamento dos seus processos. Por sua vez, a área de sistema de informação do IEFP também deverá iniciar um caminho idêntico ainda durante este ano.
Medir e Acompanhar o Desempenho dos Processos
Depois de concluída a segunda fase, faltava dar o passo seguinte: monitorizar e acompanhar o desempenho dos processos. Esta fase foi iniciada no início de 2006. Apesar da segunda fase ter sido concluída em Outubro de 2005, foi dado algum tempo para que todas as unidades internas do IEFP se sintonizassem com as novas formas de trabalho uniformizadas, dado o grande número de unidades operativas a implementarem os novos processos standard. Em número de funcionários, dá cerca de 700 pessoas envolvidas nesta restruturação.
Sara Ribeiro acha que o balanço definitivo do projecto só poderá ser feito no início de 2007 - ou seja, depois de concluído todo o ano de 2006. De qualquer forma, já é possível tirar algumas conclusões. A primeira grande conclusão é que todas as unidades operativas abrangidas pelos serviços administrativos a nível nacional trabalham actualmente da mesma forma. Isto permite medir desempenhos a nível nacional, comparar esses desempenhos, eleger boas práticas, implementar melhorias de processos, etc.
Os serviços administrativos do IEFP já conseguem medir o desempenho dos seus processos a nível nacional desde o início deste ano, pelo que 2006 vai ser o ano de partida para a melhoria contínua dos processos. Quando anteriormente as várias unidades operativas realizavam o seu trabalho de forma diferente umas das outras (ou com algumas diferenças), era impossível (ou muito trabalhoso) comparar desempenhos e avaliar as razões porque uns atingiam os resultados melhor do que outros. Com a standardização dos processos a nível nacional - todos a trabalhar da mesma forma - a comparação, a medição e a avaliação tornou-se uma realidade.
A ideia de que 2006 vai ser apenas o ano de partida, mais do que um ano de conclusões, fundamenta-se na inexistência de histórico. Evidentemente, os serviços administrativos do IEFP partiram para a implementação dos processos com determinados objectivos quantitativos em mente. No entanto, Sara Ribeiro sublinhou que esta questão dos objectivos é complexa.
Como é que se definem objectivos sem referências concretas? Sem histórico? Claro que existe alguma experiência passada no desempenho de processos análogos (destinados a atingir o mesmo fim). Contudo, como é que se devem estabelecer os objectivos de um determinado processo? Com base no desempenho passado de uma unidade de Lisboa, do Algarve, ou do norte do país?
Por exemplo, como é que se pode estabelecer como objectivo reduzir em 50 por cento o número de erros de um processo quando não sebe quantos erros erram cometidos no passado? Só a partir da standardização e da medição dos processos é que se podem estabelecer objectivos concretos e realistas.
A solução encontrada foi estabelecer objectivos para os novos processos com base na experiência passada, mas não de uma forma rígida. Só a partir da experiência concreta durante 2006 (ano em que todos passaram a trabalhar da mesma forma) é que vai ser possível estabelecer objectivos realistas para cada processos a nível das várias unidades orgânicas do IEFP abrangidas pelos serviços administrativos. O ano de 2007 será assim o ano de partida para a optimização dos processos standard implementados.
Medir todos os processos, apesar de estarem divididos em três categorias
Durante este primeiro ano, em que os serviços administrativos do IEFP espalhados pelos país seguem todos os mesmos processos, optou-se por medir todos os processos, e não apenas os mais críticos. Muitas organizações começam pela optimização dos processos mais críticos, estendendo depois gradualmente esse trabalho aos restantes. No IEFP optou-se por medi-los a todos logo no primeiro ano.
No entanto, para efeitos de estabelecimento de objectivos, os processos foram divididos em três níveis (A, B, e C). Os processos de nível A são prioritários para a organização. São aqueles que é mais importante medir e acompanhar para prevenir eventuais riscos. Por outro lado, estes processos são aqueles que não sofreram muitas alterações, o que implica que as pessoas só precisam de se ajustar a algumas pequenas novidades em termos de trabalho.
Os processos de nível B são aqueles que precisavam de algum tempo de acompanhamento e monitorização prévios, de forma a ajustar os sistemas de informação internos para a recolha dos dados desses processos. Por último, os processos de nível C são aqueles que apresentam maior dificuldade na recolha de dados face à parametrização actual dos sistemas de informação do IEFP. Consequentemente, irão ser refinados a mais longo prazo, dado que irão implicar a parametrização dos sistemas de informação. Como referiu Sara Ribeiro, a recolha manual dos dados é impensável, dada a relação custo/benefício desfavorável.
A medição dos processos implica medir pessoas
Os dados dos processos são recolhidos pelas pessoas e introduzidos em folhas de cálculo, com base em relatórios prévios existentes no sistema de informação do Instituto. Cada chefe de equipa tem assim a responsabilidade de ir carregando os dados da sua área, existindo depois a consolidação dos mesmos com base num coordenador de equipas.
Como a medição de processos implica sempre a medição das pessoas que os desempenham, procurámos saber qual tem sido a reacção dos funcionários do IEFP abrangidos pela standardização e monitorização de processos. De acordo com Sara Ribeiro, as pessoas têm tido uma reacção dupla. Por um lado, sentem-se orgulhosas por estarem a avançar para métodos de trabalho que consideram melhores do que os tradicionais.
Por outro lado, sentem-se receosas, uma vez que a monitorização dos processos permite saber exactamente o que as pessoas fazem, como fazem e qual o seu grau de desempenho. Por exemplo, os erros ficam agora documentados, enquanto que anteriormente não existia qualquer registo dos mesmos. De igual modo, cada interveniente no processo tem agora responsabilidades claramente definidas, que lhe serão imputadas sem qualquer ambiguidade no caso de incumprimento.
Qualquer mudança na forma de trabalhar já é difícil para as pessoas (afinal, todos somos animais de hábitos e rejeitamos instintivamente a mudança). Se acrescentarmos à mudança a avaliação concreta do trabalho de cada um, as dificuldades em aceitar são ainda maiores. Isto acontece em qualquer organização, embora com maiores ou menores resistências.
Desta forma, é imprescindível o envolvimento da gestão de topo em projectos deste tipo. Caso contrário, as pessoas que estão num nível mais operacional (na base da pirâmide) dificilmente irão aderir à mudança. Isto acontece por razões meramente instintivas (reagem negativamente à mudança) e por razões racionais (sentem-se protegidas porque a gestão de topo também não aderiu).
A grande importância do trabalho orientado a processos é fundamental para a sobrevivência das organizações actuais, uma vez que precisam de sobreviver para além das pessoas. Isto só é possível se a forma de realizar o trabalho não estiver exclusivamente na cabeça das pessoas. Os processos são uma forma de formalizar o modo de fazer as coisas nas organizações, salvaguardado estas últimas contra a grande mobilidade laboral existentes nos nossos dias.
Por outro lado, como cada indivíduo fica a saber claramente qual é o seu trabalho e quais são as suas responsabilidades, fica salvaguardado face às eventuais ineficiências de terceiros - evitando-se assim sobrecargas de uns face a outros e responsabilizações da pessoa errada.
Mecanização de processos e mecanização de pessoas
Quase todos já tivemos que estudar, ou já ouvimos falar das tentativas de mecanização do trabalho, sobretudo no início da era industrial. Essas metodologias foram depois mais ou menos abandonadas devido à ideia de que estavam a transformar as pessoas em peças "cegas" de uma engrenagem. Será que o trabalho orientado a processos não é uma forma de revivalismo dessa mecanização das pessoas?
Sara Ribeiro rejeitou claramente esta ideia e considerou mesmo que o trabalho baseado em processo é o inverso da mecanização. Nas metodologias da era industrial, as pessoas eram peças "estúpidas" da engrenagem. Faziam algo, mas não sabiam com que fim. Na gestão moderna, as pessoas que intervêm num processo sabem qual é o seu grau de responsabilidade para o cumprimento do objectivo do processo e têm uma boa compreensão de todo o encadeamento de tarefas.
A nossa entrevistada sublinhou ainda que, mais do que fazer, o que é importante na metodologia de trabalho orientado a processos é fazer com que as pessoas pensem o trabalho/processo (ficando a saber assim porque fazem e para que fazem). O que está aqui em evidência é a consciencialização do trabalho.
No passado, só interessava o como fazer. O porquê e o para quê eram privilégio apenas dos indivíduos situados nos níveis mais elevados da pirâmide. Perdia-se assim o sentido da responsabilidade, enquanto que actualmente se procura evidenciar a responsabilidade de cada indivíduo ao longo do encadeamento das tarefas de um dado processo.